terça-feira, 10 de abril de 2012

Poesias de Ramallo Ortiz

Homenagem Aos Poetas Mortos

Às vezes penso: a morte é bem vinda!
Por desespero  jamais,
nem por pensar que o mundo
não tem jeito, pelo contrário,
os loucos podem mudá-lo.

Perdidos entre uma geração
e outra que se foi, não tivemos
o prazer de conhecer em vida
nossos ídolos, mas os que vivem
podemos conhecer, tê-los
como amigos.

Os malditos são os bons!
Viva Raul Seixas!
Viva Sérgio Sampaio!
Se foram porque
a morte é certa. 



Nesse Mundo

Nesse mundo onde muitos
são obrigados a engolir sapo
parece tudo sempre na mesma:
voltar ao passado e sentar
para esperar um futuro
que os faça crer na beleza da vida.
  
Porque sorrir nem sempre dar mais,
pois os dentes não são tão belos
como os do artista do comercial.



Na Academia

Às vezes na academia é raridade
encontrar quem realmente lê
uma obra antes de comentá-la,
antes de ler o artigo 
com o comentário;

basta ler o que outro já escreveu
sobre a obra ou então é melhor
ler a orelha e sair falando
parecendo intelectual.

Falar com autoridade
só se for graduado,
é preciso mestrado,
e ainda, vale mais
o doutorado, senão
ninguém dar ouvidos. 



A Fundo

Quem foi a fundo na loucura
para nunca mais voltar
foi como se tivesse voltado
para mostrar o caminho,

foi como se tivesse voltado,
não obrigado, mas para poder
ficar de fora e por dentro,
o louco consciente, alegre

por estar de fora, não quer
ficar mais ali, dentro dos muros
que aprisionam mentes 
que nunca saíram de si.  


Dionísio Na Caatinga
                                                     Inspiração a partir de um quadro
                                        do pintor Cipriano Sousa

Por onde Dionísio passa,
revira tudo, muito vinho;
na caatinga é cachaça
ou jurubeba, as mulheres
tiram os potes da cabeça
e os jogam no chão, para
seguir o deus do vinho
e da loucura, dos loucos
para viver e serem salvos.

Os maridos enlouquecem,
Padre Cícero não dá jeito,
Lampião nem passa perto,
Luiz Gonzaga toca forró,
é uma orgia só. Apolo desiste.
Menino! Vai lá em Cabrobó
que a seca acabou, a festa
não tem tempo de parar
e a cachaça ele multiplicou.  


Contra-cultura 

Prejudicam semelhantes
Através da mentira,
Em versos sobre eles
Faço jorrar minha ira.

Os oprimidos desenvolvem
A hostilidade contra a civilização
Que os mesmos ostentam
E geram o desejo de destruição.

Em cada menino podemos ver
O processo de transformação
Numa cultura que aumenta
E alimenta a insatisfação,

Cresce o número de neuróticos
Cansados da mais-valia,
Cresce a vontade de trasnformar
E a ânsia de rebeldia.

Onde estão o patrimônio espiritual
E os meios de estrutura
Que possam reconciliar
O homem com a cultura?